sexta-feira, 31 de julho de 2009

Saúde e beleza depois do câncer de mama



Doença atinge cada vez mais mulheres no País; dano psicológico pode ser profundo, mas segundo entrevistadas pode ser superado


Gracieli Polak
CANOINHAS
Elas cuidavam da saúde, tiveram filhos, amamentaram, não pertenciam especificamente a nenhum grupo de risco do câncer de mama, mas, mesmo assim, desenvolveram a doença cancerígena que hoje é, de acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca), a mais temida pelas mulheres não só pela alta frequência, mas também pelos danos psicológicos. Zenita König e Ernestina de Lima Gonçalves (foto) são exemplos de mulheres que nunca imaginaram ter de enfrentar uma doença tão agressiva quanto o câncer de mama, mas passaram por ela e venceram não só a doença, como os danos psicológicos que ela causa em grande parte das mulheres.
Ernestina descobriu que estava com câncer depois de uma biópsia em um nódulo encontrado na mama durante um dos plantões que fazia no Hospital Santa Cruz de Canoinhas, há 19 anos, quando trabalhava como parteira e enfermeira. “Eu senti uma dor, fiz o exame e deu aquele resultado. Eu nunca achei que teria câncer de mama: tive seis filhos, amamentei todos por bastante tempo, nunca tomei anticoncepcional, tinha uma vida saudável. Um dia apareceu”, lembra. “Ninguém está preparado para receber a notícia que tem câncer, ninguém está”, conta. Da descoberta da doença até a cura, segundo ela, um mundo de incertezas e provações se revelou nos corredores do Hospital Erasto Gaertner, referência no tratamento de câncer em Curitiba, unidade de tratamento de destino dos pacientes de Canoinhas naquela época.
Submetida à retirada do tumor, que causou uma pequena mutilação no seio e às intensas sessões de radioterapia, Ernestina conta que sofreu bastante, mas decidiu lutar para conseguir terminar de criar os filhos mais novos, sem se importar com as alterações físicas. “A prioridade foi conseguir continuar viva, cuidar dos meus filhos. Com meu corpo eu me entendi depois e hoje nos damos bem, nos entendemos”, diz.

OCORRÊNCIA PRECOCE

Aos 28 anos de idade, amamentando o segundo filho, que na época tinha cerca de cinco meses, Zenita sentiu um nódulo no seio quando brincava com a criança. Imediatamente procurou ajuda médica e fez exames, mas nada de grave foi constatado. “Os médicos me diziam que era próprio a amamentação e todos os exames tiveram este resultado, mas mesmo assim eu não fiquei sossegada”, conta. Meses depois, com a permanência do caroço no seio, ela foi submetida a uma cirurgia para remoção, permaneceu no hospital por um dia e voltou para casa ciente de que a situação estava resolvida. Dias mais tarde, uma nova consulta médica revelou que o tratamento ainda não havia acabado.
Na primeira consulta com um especialista, em Curitiba, Zenita, que ainda não sabia exatamente o diagnóstico de sua doença levou um susto. “A primeira coisa que o médico me falou é que eu precisava retirar completamente o meu seio. Eu tinha ido até lá imaginando que faria um tratamento preventivo, ou algo assim, e levei aquele choque. A sensação é inexplicável e condiz com aquela expressão ‘estar nas nuvens’. Você perde completamente o chão”, conta. Dias depois ela retirou completamente a mama doente e começou a fazer as sessões de quimioterapia, que entre outros efeitos colaterais, fez com que seu cabelo caísse. “É uma fase muito difícil da doença, porque atinge a vaidade, deixa insegurança com o próprio corpo, mas meu marido esteve presente em todos os momentos, me deu apoio total e isso foi fundamental”, afirma.

VIDA NORMAL

Zenita passou por uma mastectomia completa no seio doente, fez o tratamento até o final e nunca mais apresentou os sintomas da doença, monitorada periodicamente. Dois anos depois do câncer, resolveu engravidar do terceiro filho, mesmo com os riscos. Contrariando expectativas, teve uma gravidez tranqüila e amamentou o filho por mais de um ano na mama sadia. “O engraçado é que, quando eu sentia o leite descer, era nas duas mamas, mesmo ela não estando lá”.
Mesmo curada, o incômodo com a mutilação levou Zenita a procurar um cirurgião plástico para a reconstrução do seio, ainda que não tivesse o apoio do marido para a realização da plástica, que não teve o resultado esperado. “Ela não ficou do jeito que eu esperava, necrosou a área, sofri bastante, mas me recuperei. Hoje eu gostaria muito de fazer outra cirurgia reparadora, mas só a faria se tivesse 100% de certeza de que ficaria do jeito que eu quero. Eu estou de bem com meu corpo, mas se pudesse mudar, mudaria”, relata

SUS REALIZA

Buscando a recuperação da auto-estima, a dona de casa Zeli Soares Jarentchuk procurou recentemente a reconstrução da mama amputada por causa de um câncer há 11 anos. Zeli estava prestes a conseguir a realização gratuita do procedimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS), mas desistiu da cirurgia antes da realização dos exames definitivos. “Eu queria muito reconstruir minha mama, não por motivos estéticos, mas para mim mesma, para elevar minha auto-estima. A gente se sente mutilada, não é fácil. Só quem passa por isso sabe o que é”, conta.
A vontade de realizar a cirurgia, no entanto, não foi maior que o medo de passar por novas complicações de saúde. “Eu teria de tirar pele das costas para implantar na mama, segundo me instruíram os médicos. Conversei com minhas filhas e com meu marido e cheguei a conclusão de que não valeria a pena”, diz. Mesmo buscando o procedimento pelo SUS, Zeli explica que o tempo de espera no seu caso foi bem pequeno e que havia apenas três pessoas na fila de espera pela cirurgia, que seria realizada no Hospital Universitário, em Florianópolis. “Fiquei com medo de perder meus movimentos, minha qualidade de vida e decidi por não fazer. Às vezes essa é a melhor decisão”, afirma.

ALTA INCIDÊNCIA

De acordo com o Inca, o câncer de mama é uma das principais causas de morte nas mulheres dos países ocidentais, com estatísticas indicando aumento de incidência tanto nos países desenvolvidos quanto nos países em desenvolvimento. No Brasil, ele é a doença que mais mata mulheres e o câncer mais comum ao organismo feminino. A alta mortandade e os as seqüelas psicológicas resultantes da doença estimulam mobilizações públicas para o combate à doença. Entre as medidas recomendadas, além de bons hábitos de saúde, está o auto-exame periódico das mamas e a mamografia depois dos 35 anos.
Em Canoinhas, a Associação dos Pacientes Oncológicos da Região de Canoinhas (Apoca) atende a aproximadamente 250 pacientes periodicamente.